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segunda-feira, 9 de março de 2015

Mercado inflacionado, a bolha estourou, as folhas salariais ficaram fora da realidade. O futebol brasileiro vive seu pior momento financeiro

A situação financeira do Brasil não é a das melhores. Inflação, dólar em alta, Petrobrás às escuras. O mesmo acontece com o futebol. O tempo é de “vacas magras”, com cautela dos dirigentes, poucos investimentos dos clubes e apreensão em relação aos gastos na estrutura administrativa. Muito se discute sobre a renda e o público total dos jogos. 

Salários astronômicos, dívidas atrás de dívidas, filosofia arcaica. A mentalidade do futebol nacional mudou. É mais do que necessário apostar na base das temporadas anteriores e contratar peças pontuais – baratas –, que podem no futuro render lucros e garantir equilíbrio ao orçamento.

As cotas de TV ainda são um sonho para as equipes menos favorecidas no cenário futebolístico. Flamengo e Corinthians continuam dominando esse tópico. Porém o clube paulista pode ter uma defasagem, já que a TV Globo, dona do futebol, não transmitirá duas partidas do Corinthians na Libertadores. E a Fox Sports transmitirá com exclusividade as partidas contra o Danúbio e San Lorenzo. 

Nesta temporada, o Timão terá um déficit operacional que já atingiu R$ 60 milhões, segundo balanço de sua diretoria, devido às receitas abaixo do esperado e a gastos muito acima do previsto com contratações e salários de jogadores. Além disso, o clube tem que pagar a primeira parcela da Arena Corinthians e sofre para arranjar os famosos naming rights. Tanto é que o Corinthians aceitou reduzir de R$ 400 para R$ 100 milhões o valor oferecido no mercado. 

Segundo estudo da Itaú BBA, o Flamengo pode fechar o ano com um lucro de R$ 79 milhões, ao faturar R$ 316 milhões e ter despesas de R$ 237 milhões. Para isso, o clube rubro-negro deve se apoiar em três principais pilares: aumento de patrocínios, bilheteria e, principalmente, o programa de sócio torcedor. Somente com sua camisa, o Flamengo espera obter R$ 90 milhões em 2015.

Já o Fluminense luta para honrar com os salários dos jogadores, entre eles Fred, que ganha quase R$ 700 mil mensais. Conca foi para China. Diego Cavalieri ainda é uma incógnita. O Botafogo, por sua vez, retornou à Série B após 12 anos e luta para melhorar sua saúde financeira. De acordo com Carlos Alberto Torres, campeão com a Seleção Brasileira na Copa de 1970, a média salarial da equipe carioca é de R$ 50 mil.

O elenco do Botafogo está avaliado em 21,05 milhões de euros (cerca de R$ 69,4 milhões). Bahia, Vitória, Criciúma, Ceará, Santa Cruz, Náutico, Bragantino, ABC e América-MG fecham o top 10. Porém, o clube alvinegro traz nas suas camisas anúncios incomuns. Ontem, no clássico contra o Fluminense, foi a vez do “Secador Britânia 1900W” por R$ 49 em alusão ao Dia Internacional da Mulher na “Liquidação maluca” da Casa & Vídeo. O clube “inovou” mais uma vez: durante o intervalo, o preço caiu para R$ 39.

A jogada da Casa & Vídeo só começou a render no decorrer da semana passada, quando a loja começou na rede social a escolha do produto que seria exposto. A Casa & Vídeo, segundo o globoesporte.com, pagou R$ 140 mil pelos dois clássicos. O anúncio foi bom para a loja, mas não para os torcedores, que demonstraram insatisfação. 

Atlético e Cruzeiro terminaram 2014 à procura de novo patrocinador master, já que o Banco BMG deixou de investir no futebol. O sucesso acabou compensando o prejuízo orçamentário. Ao prever a difícil situação econômica de 2015, o alvinegro enxugou 20% dos gastos, principalmente na folha salarial. Diego Tardelli foi para o mercado exótico da Ásia. E o valor arrecadado será de R$ 208 milhões – seu principal patrocinador será a MRV Engenharia. 

Já o Cruzeiro negocia com a Caixa Econômica. Perdeu peças importantes nesta última janela de transferências. Everton Ribeiro foi para o Oriente Médio. Ricardo Goulart e Marcelo Moreno rumaram para a China. Lucas Silva preferiu o certo do que o duvidoso e acertou um contrato com o Real Madrid.

Crefisa, Prevent Senior, Faculdade das Américas (FAM) e Tim pagarão, juntas, cerca de R$ 50 milhões ao Palmeiras em 2015. O número é mais de seis vezes superior aos R$ 8 milhões que estavam previstos em orçamento para ganhos com patrocínio nesta temporada. E mais marketing está por vir, ou seja, maior lucro. 

O site “Máquina do Esporte” revelou na última semana que um túnel em forma de porco será utilizado para a entrada dos atletas no campo, também com patrocínios. Porém essa ideia não é exclusiva. O Red Bull Brasil, time que tem sua filial em Campinas, faz o mesmo. 

Grêmio e Internacional viveram em 2012 um ano extraordinário no campo das finanças. Com renovações de contrato com patrocinadores e, especialmente, com a TV Globo, os atuais dirigentes conseguiram saldar dívidas históricas. Hoje a situação não é bem assim. 

A dupla Gre-Nal precisa contar com a criatividade. Após enxugar o elenco, a equipe conseguiu reduzir a folha salarial. Mas ainda conta com Kléber Gladiador. O atleta não joga pela equipe gaúcha, mas o próprio clube paga os salários do atleta. Além disso, o Tricolor divide os resultados do seu novo Estádio com a OAS, o que gera uma redução nas receitas. Por conta disso, até as contratações estão sendo tratadas de maneira comedida pela nova gestão.

Já o Inter teve um desafio maior. Se no Beira-Rio não houve espaço para todos os sócios (são mais de 100 mil), imagine em um estádio do Interior? Por conta das obras para a Copa do Mundo de 2014, o clube foi obrigado a deixar de atuar temporariamente no seu estádio e teve que atuar em Caxias do Sul durante o primeiro semestre de 2013. As receitas foram poucas neste período. Mas após a Copa, a renda vem subindo gradualmente. 

A gestão do futebol brasileiro precisa de uma profunda transformação. Estamos vivenciando uma fase difícil. Os campeonatos não são atrativos para os torcedores e imprensa, principalmente televisiva. Vale aqui uma comparação com a NFL e a MLS, ambas ligas norte-americanas. 

A NFL negocia diretamente as cotas de televisão, uma das maiores fontes de receita, e repassa valores rigorosamente iguais aos clubes: cerca de US$ 200 milhões anuais. No Brasil, a Rede Globo, detentora dos direitos de transmissão, negocia números distintos com cada clube: Flamengo e Corinthians, por exemplo, recebem R$ 110 milhões por ano, enquanto times como Sport e Coritiba não ultrapassam os R$ 27 milhões. 

Os números do novo contrato da MLS, de duração de oito anos, não são revelados. Mas podem chegar, ou superar, os 70 milhões de dólares (R$ 158 milhões). O valor é dividido igualmente entre as 19 equipes da liga. As emissores Fox, ESPN, NBC e Univisión transmitirão 125 partidas por temporada. Mas os clubes podem arrecadar um "por fora", pois são livres para fechar contratos com emissoras locais de suas regiões.

Uma solução para a melhoria de receitas e atrair mais o público seria a entrada de empresas para gerir os eventos, como o trabalho da TV Esporte Interativo, que recentemente fechou uma parceria com a Turner, empresa norte-americana. Logo de cara, a parceria anunciou a transmissão exclusiva da Liga dos Campeões da Europa durante três temporadas. 

O Esporte Interativo, que tem sede no Rio de Janeiro, São Paulo e abrange o Nordeste, transmite a Copa do Nordeste. O canal de televisão a cabo apostou nas rivalidades regionais e reacendeu o futebol nordestino, onde a maioria dos clubes passou a frequentar divisões inferiores do Brasileirão. Além disso, o canal exibe a Copa Verde, no qual equipes da Região Norte e Centro-Oeste (exceto Goiás), mais o Espírito Santo disputam o torneio. O campeão ganha uma vaga na Copa Sul-Americana. 

O torneio nasceu a partir da proposta de se fazer uma competição regional, como a Copa do Nordeste. Ou seja, uma inovação para atrair o público de casa e uma saída para os torcedores acompanharem seu time nos estádios. 

Mercado inflacionado, a bolha estourou, as folhas salariais ficaram fora da realidade. O futebol brasileiro vive seu pior momento, tecnicamente e financeiramente. A modalidade precisa ser urgentemente repensada. 

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