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quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Racismo no futebol brasileiro: casos, soluções, perspectivas e o grande dilema: como punir e acabar com o episódio?

A torcedora gremista Patrícia Moreira é flagrada pelas câmeras de transmissão do jogo entre Grêmio e Santos chamando o goleiro Aranha de "macaco".


A história do futebol brasileiro contém, ao longo de quase um século, registros de episódios marcados pelo racismo. Eis o paradoxo: se de um lado a atividade futebolística era depreciada aos olhos da “boa sociedade” enquanto profissão destinada a pobres, negros e marginais, de outro ela se achava investida do poder de representar e projetar a nação em escala mundial.

Casos de discriminação racial fazem parte da história do futebol desde que o esporte chegou ao Brasil. No início, o esporte adotado pela elite excluiu os negros. No Brasil, em alguns clubes eles eram proibidos de jogar até a década de 1950, como no caso do Grêmio. O Vasco da Gama foi o primeiro clube a aceitar oficialmente esportistas negros.

Neste ano, já foram registrados 14 casos de racismo no futebol brasileiro; porém alguns ganharam mais destaques, como o do volante Tinga (Cruzeiro); do árbitro Márcio Chagas, do Rio Grande do Sul; e o mais recente e comentado: do goleiro Aranha, do Santos. Este último aconteceu no dia 28 de agosto.

O episódio aconteceu aos 43 minutos do segundo tempo, quando o placar já apontava 2 a 0 para os santistas frente ao Grêmio, em jogo válido pela Copa do Brasil. Os xingamentos partiram de uns grupos de torcedores gremistas localizados atrás do gol defendido por Aranha na segunda etapa, setor normalmente destinado às organizadas na Arena do Grêmio.

Patrícia Moreira (foto) foi uma das envolvidas. Ela foi pega pelas câmeras que filmavam o jogo ofendendo o goleiro de ‘macaco’. Após ter a sua imagem veiculada, em poucos minutos as redes sociais foi palco de revoltas. Tanta revolta acabou culminando na sua prisão e afastamento da torcida porto-alegrense. E o Grêmio foi excluído da competição, gerando rancor.

Mas quando começou o racismo no futebol brasileiro?

Em um dos casos mais polêmicos do futebol, o jogador Grafite, que atuava pelo São Paulo, em 2005, foi alvo de ofensas racistas do jogador Leandro Desábato, do Quilmes, time da Argentina. O jogo era válido pela Libertadores da América, os dois times se enfrentavam no estádio do Morumbi, em São Paulo, quando o são-paulino empurrou o rosto do zagueiro argentino e foi expulso de campo.

Ao justificar sua atitude, Grafite afirmou que foi vítima de racismo, ao ser chamado de “macaco” pelo argentino Desábato foi preso no gramado e ficou dois dias na prisão. O atacante prestou queixa contra o argentino e o jogador só foi liberado após pagar uma multa de R$ 10 mil, e pôde voltar à Buenos Aires, mas se comprometendo a voltar ao Brasil durante o processo.

Quem punir e como punir?
O cenário abre espaço para dois pontos polêmicos - quem punir e como punir. A legislação esportiva dá margem para punições rígidas, mas o texto é dúbio em uma questão central: até onde penalizar os clubes aos quais estão ligados os agentes das manifestações racistas. Geralmente, as penas englobam multas e perdas de mando de campo.

Para o advogado desportivo Maurício Corrêa da Veiga, é fundamental que todas as normas existentes sejam aplicadas.

- No Brasil, temos inúmeros instrumentos normativos. Portanto, não é por falta de lei que os casos de racismo e de discriminação racial não são punidos, mas sim por falta de vontade das autoridades competentes – afirma o advogado.

Campanha educativa resolveria o problema?
Corrêa da Veiga comenta que as campanhas são sempre educativas e podem ajudar. Porém, não é apenas isto.

- As campanhas educativas são importantes e podem orientar o torcedor. Porém, creio que a medida mais eficaz, além da conscientização, é adotar mecanismos de punição para o clube, desta forma, a entidade desportiva adotará os meios necessários para coibir práticas de racismo ou de injúria racial – diz o advogado desportivo.

Racismo, injúria racial ou apartheid?
O sociólogo Marcos Rolim diz que os três fenômenos estão misturados porque os negros são maioria entre os pobres. Rolim ainda diz por que Pelé é tão aclamado pela sociedade.

- No caso, o sucesso, a fama e a riqueza agem como elementos de valorização que costumam neutralizar – para aquele personagem – as reações típicas do racismo – afirma o sociólogo.

Sobre a diferença entre racismo e injúria racial, o sociólogo faz uma rápida diferenciação.

- Se alguém impede que um negro tenha acesso a uma escola, por exemplo, pelo fato de ser negro, isto configura o crime de racismo.  Se uma pessoa agride verbalmente um negro, chamando-o de “macaco”, por exemplo, este é o crime de injúria racial – conclui ele.

A exclusão do Grêmio na Copa do Brasil e a posição do STJD
O advogado Márcio Corrêa da Veiga comenta a posição do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) em dois quesitos: na exclusão do Grêmio na Copa do Brasil e na falta de competência criminal para punir os envolvidos no caso de racismo.

 - Deve ser ressaltado que aquele órgão administrativo (STJD) não tem competência criminal, porém, o Código Brasileiro de Justiça Desportiva prevê penas duras para esta prática criminosa (art. 243-G), inclusive com a exclusão do clube do torneio – comenta o advogado.

- A exclusão do time envolvido, daquele campeonato, pode parecer uma pena injusta e desproporcional, pois, afinal, foi apenas um grupo de indivíduos (não evoluídos) que cometeu o ato. Apesar disso, a partir do momento em que você pune a agremiação em razão do ato criminoso praticado por determinado grupo, possivelmente não haverá reincidência, pois os dirigentes terão cuidados redobrados no tocante à fiscalização de seus torcedores – conclui Veiga.

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