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terça-feira, 28 de abril de 2020

Não estão pensando em vidas, apenas na "lucratividade"

Inter de Limeira x Palmeiras, antes da paralisação devido à pandemia do COVID-19 (Foto: Cesar Greco)
Enquanto França e Holanda decidiram encerrar seus campeonatos locais, a Alemanha atrasou a retomada da Bundesliga e a Espanha faz um estudo para definir o planejamento para a volta das atividades, o Brasil, conhecido por uma declaração de "gripezinha" por parte do representante maior sobre a crise do coronavírus, quer voltar o futebol, sem nenhuma base científica. Quer voltar para se sentir o poderoso. Mostrar para os demais que tudo pode ocorrer normalmente. Não pode. Nem vai funcionar.

Só em 24 horas, foram confirmadas mais de 470 mortes e outros cinco mil casos de COVID-19. Será mesmo que é hora de pensar no futebol? Que o esporte faz falta nas nossas vidas, isso não há dúvidas, principalmente para aqueles que trabalham direta ou indiretamente, e para aqueles que assistem aos jogos.

A verdade é que o país não está preocupado em salvar vidas. E, sim, no interesse. Na lucratividade. Convenhamos: não haverá lucro também. Afinal, as partidas teriam que ocorrer com portões fechados. Nenhum torcedor poderia marcar presença.

Quem garante que a retomada do futebol no Brasil diminuiria o número de casos? Quem garante que bares e restaurantes, hoje fechados, não seriam abertos para que eles pudessem lucrar, mas, ao mesmo tempo, juntassem diversas pessoas? Causando o quê? Exatamente: aglomerações. Algo que não é recomendável. E quem diz isso é a ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE!!

Reafirmo o que tem escrito tanto aqui quanto nas redes sociais: não se refuta a ciência com achismos ou ideias sem sentido. Não se escuta um técnico de futebol, achando que ele é especialista em medicina. Aliás, esse mesmo treinador furou a quarentena diversas vezes para ir à praia, contrariando as recomendações. Parece-me que não tem muita moral para falar sobre o assunto. Detalhe: foi o porta-voz para que as partidas de futebol fossem canceladas, alegando que atletas, profissionais da imprensa e outros funcionários também poderiam ser contaminados pelo coronavírus.

Vamos respeitar a ordem do tempo. E das autoridades competentes. Não se faz loucura para tentar agradar gregos e troianos, para depois se arrependerem e soltar aquela frase esdrúxula: "pedimos desculpas aos envolvidos".

sábado, 25 de abril de 2020

Treze anos depois, o pagamento de uma dívida. Será?

Seleção feminina conquistou o Ouro no Maracanã (Foto; Flavio Florido/UOL)
Uma das maiores conquistas da Seleção Feminina. Ou a maior. As mulheres brilharam em solo brasileiro, no palco do futebol tupiniquim. O mês de julho do ano 2007 não saíram tão cedo da memória de personagens tão icônicas do futebol feminino.

O que é disputar uma final do Pan-Americano, no Maracanã, com mais de 67 mil pessoas cantando e vibrando? A consagração de uma geração. Detalhe: era quinta-feira, meio-dia.

Um título incontestável. A goleada sobre os Estados Unidos por 5 a 0 foi a cereja do bolo. Afinal, em seis jogos disputados, foram seis vitórias. Trinta e três gols anotados. Rainha Marta foi artilheira, reinou. Nós tivemos que reverenciá-la e aplaudi-la por 12 vezes só no Pan.

O roteiro para a glória contou com goleadas marcantes: 4 a 0 sobre o Uruguai, 5 a 0 contra a Jamaica, um impiedoso 10 a 0 sobre o Equador, um surpreendente 7 a 0 diante das canadenses e 2 a 0 sobre o México - jogo mais difícil daquele torneio.

A final contra os Estados Unidos estava rodeada de expectativa. Quem poderia parar aquela máquina brilhante de assistir? Quem poderia parar a genial Marta? E tinha Cristiane, Daniela Alves, Kátia Cilene. Constelação em pleno sol a pino.

O Rio de Janeiro parou para presenciar e prestigiar as mulheres guerreiras em campo. O Brasil parou em frente à televisão para entender que, sim, existia futebol feminino. Sim, as mulheres sabiam jogar. Sim, além das adversárias dentro das quatro linhas, elas tinham que enfrentar - e ainda enfrentam - o machismo, o preconceito, o olhar torto. "Futebol feminino, o que é isso?"

Há 13 anos, tudo era diferente. O modo de se comunicar e, consequentemente, a divulgação de uma modalidade que já havia sido destaque três anos antes, em 2004, quando conquistou a medalha olímpica, em Atenas. Mas quem se importava?

Na verdade, o que importava era título. Se não ganhasse, as guerreiras eram tratadas com desdém, eram escanteadas, e a palavra fracasso seria utilizada para definir o final. Todavia, o que se passava nos bastidores da modalidade? Como elas treinavam? Existiam competições?

Rainha Marta encantava o mundo com seus golaços, fora eleita a melhor jogadora do Mundo pela FIFA - já são SEIS! A nossa maior representante!

Três meses depois, em setembro, na China, o Brasil ficou com a segunda colocação na Copa do Mundo feminina, perdendo para a Alemanha na decisão. A camisa 10 da Seleção fez aquele gol antológico sobre os Estados Unidos, causando uma emoção na narração do Luciano do Valle e nos telespectadores - inclusive neste que vos escreve.

Voltando ao final do Pan de 2007, Marta ganhou asas cenográficas. Cena de filme. Mas era real. Na hora de receber a medalha de ouro, as jogadoras se emocionaram e no hino, a felicidade estava estampada no rosto delas que batalharam tanto para aquele momento de ápice, e em todos os torcedores. Puderam de ver de perto um jogo de futebol feminino.

Quase 13 anos depois, uma possível transmissão daquele Ouro está em pauta. Considero como um pagamento de uma dívida. Pois, em 2017, quando houve a comemoração dos 10 anos daquele feito tão incrível, poucas ações foram feitas. Que bom que a mudança está acontecendo! 

Qualidade nos jogos, qualidade nas transmissões, profissionais capacitados, mais times em campo, novas jogadoras surgindo. E o futebol feminino vai caminhando para a sua glória e também se tornando uma paixão nacional. O caminho é árduo. Mas, no fim, há sempre um gol de placa para se comemorar.

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Título da Copa das Confederações gerou soberba na Seleção Brasileira que fracassou no Mundial

Fracasso da Seleção de 2006 (Foto: Getty Images)
A Seleção Brasileira de 2006 é apontada como uma das mais decepcionantes da história das Copas do Mundo. Como uma esquadrão com Ronaldinho Gaúcho, Kaká, Ronaldo Fenômeno e Adriano não deu certo? A resposta é muito simples: soberba. 

Um ano antes, na Copa das Confederações, o Brasil não era 100% candidato ao título da competição. A estreia contra a Grécia não foi tão empolgante. Vale lembrar que os gregos haviam conquistado a Eurocopa no ano anterior, em 2004, após vencer Portugal, comandado por Felipão, que conquistara, em 2002, o pentacampeonato.

Depois, uma derrota para o México por 1 a 0. Ou seja, a Seleção Brasileira iria para a última rodada pressionada e com chances de sair do torneio precocemente. Japão, comandado por Zico, dificultou os trabalhos. Empate por 2 a 2 e classificação suada para os comandados por Carlos Alberto Parreira.

Na semifinal, o Brasil encarou os anfitriões, que eram favoritos e passaram por uma reformulação, justamente após a Copa do Mundo. Seria uma revanche? Foi quase. Brasil contou com uma tarde inspirada do atacante Adriano Imperador, marcando dois gols. Seleção na final para encarar a Argentina.

O jogo contra a Argentina foi um ponto fora da curva. Primeiro, pela apresentação de gala da Seleção, que abriu 4 a 0. Dois gols de Adriano, um de Kaká e outro de Ronaldinho Gaúcho - Aimar descontou para os argentinos.

O título da Copa das Confederações gerou uma soberba na Seleção Brasileira que viria a disputar a Copa do Mundo. Nas Eliminatórias, em 18 jogos disputados, foram nove vitórias, sete empates e duas derrotas - para Equador e Argentina. Inclusive, o 3 a 1 para os hermanos foi uma aula tática.

Na Copa do Mundo, atuações mornas, longe de empolgar a torcida brasileira. E a eliminação veio contra a França. Gol de Henry, numa falha absurda do Roberto Carlos, que tem, sim, uma parcela muito grande de culpa.

O "Quadrado Mágico" que tanto encantou o mundo do futebol em 2005 foi um fracasso no ano seguinte. Uma bagunça tática impressionante. Carlos Alberto Parreira e toda sua comissão técnica não conseguiram arrumar o que estava desorganizado.

E aqui é preciso citar a preparação no povoado de Weggis, na Suíça. Uma cidade de 4 mil habitantes, o trabalho tinha tudo para ser pacato. Foi longe disso. Os treinos transformaram-se em uma imensa festa, tanto de torcedores quanto de jogadores. 

Lembra da Copa do Mundo de 2014? Neymar e companhia andando de carrinho pelo jardim da Granja Comary, programas de televisão usando e abusando das entrevistas na concentração. Ali, faltou uma assessoria de imprensa firme e competente que proibisse as farras.

Vale lembrar que, em 2013, a Seleção fez uma das melhores Copas das Confederações. Excelentes jogos, principalmente contra o Uruguai, na semifinal, e a temida Espanha, na grande final. Três a zero no Maracanã - Fred jogando o fino da bola. 

Novamente, um ano depois, numa espécie de síndrome de Copa do Mundo, a Seleção não encantou, apresentou erros toscos e veio a humilhação diante da Alemanha - aquele 7 x 1.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

Em tempos de isolamento, futebol é uma terapia

Seleção Brasileira de 1970 que encantou o Mundo (Foto: Divulgação/CBF)
Sabemos que as modalidades esportivas estão suspensas por tempo indeterminado. Não se sabe quando a bola voltará a rolar pelos gramados, ou subir nos ginásios, ou quando os carros ultrapotentes acelerarão nas pistas pelo mundo afora.

Mas o esporte tem sido uma terapia em meio à pandemia do COVID-19. Emissoras esportivas têm apelado aos grandes momentos para que o telespectador não se sinta sozinho.

Tenho visto os jogos históricos das Copas do Mundo. Assisti aos de 1982 e, agora, vejo aos de 70. Que beleza ver o futebol-arte!

Não à toa que essas Seleções (com s maiúsculo mesmo) deixam as pessoas com aquele ar de saudosismo, com os olhos marejados de nostalgia, pela beleza e poesia de um tempo em que o Brasil jogava bonito e eficiente. 

Aquele era o tempo de Pelé, Tostão, Clodoaldo, Rivelino e Leão. Depois, Sócrates, Falcão, Zico. 

É claro que o tempo passou. O mundo se transformou. E o futebol acompanhou essa mudança. Dificilmente, ou melhor, raramente veremos uma Seleção Brasileira jogar da mesma forma como aquela que encantou os meus avós e minha mãe.

O futebol tem sido uma terapia para mim, de verdade. É muito bom ver partidas com alto nível de qualidade. Jogadores determinados, que vestiam a camisa por amor, e não por dinheiro.

Mesmo sabendo de resultados históricos, como a vitória brasileira sobre a Alemanha, na final da Copa do Mundo de 2002, vibrei com a mesma ou talvez até com uma euforia ainda maior.

A gente torce, grita de nervoso, pula de alegria. A única coisa que mudou é o abraço. Por enquanto, abdiquei desse gesto de amor.

O futebol é terapêutico! Aliás, o esporte é assim. Um grande remédio em meio à falta daquilo que nos move como jornalista, como ser humano. E assim iremos.

segunda-feira, 13 de abril de 2020

Possível volta do futebol em maio é insanidade

Foto: Ivan Storti/Santos FC

Após um mês de paralisação do futebol brasileiro, a maior preocupação dos engravatados parece não ser em quais condições físicas ou até mesmo psicológicas se encontram os atletas e suas famílias. Escrevo isso porque se noticiou que a volta dos campeonatos já começa a ser discutido pelas autoridades máximas da modalidade.

Reinaldo Carneiro Bastos, presidente da Federação Paulista de Futebol, estuda a chance de retomar a disputa do Campeonato Paulista na segunda quinzena de maio. O mandatário não deve ter assistido à entrevista do Ministro da Saúde, Luís Henrique Mandetta, ao programa Fantástico, da TV Globo. Nela, Mandetta foi categórico ao afirmar que os próximos dois meses terão "dias difíceis". Ou seja, mais casos e óbitos do coronavírus, dado à dificuldade do cumprimento das medidas de isolamento social.

Uma possível volta do futebol é insanidade neste momento. Não se refuta ciência com opinião, achismos e, principalmente, com a falta de um planejamento que seja eficiente para todos os envolvidos.

Estuda-se que as partidas do estadual sejam disputadas nas cidades do interior, com portões fechados. Mas e o deslocamento das equipes até os locais dos jogos? E a segurança? E a arbitragem? E a imprensa? Como os jogadores ficariam confinados? São muitas perguntas, e nada de respostas. Mais uma vez.

As autoridades que se dizem competentes precisam tomar uma boa dose de coerência antes de tomar qualquer medida que possa se arrepender depois.

Kleberson não foi coadjuvante no pentacampeonato

Kleberson foi o melhor jogador de Brasil x Alemanha (Foto: Getty Images/FIFA)
Com os campeonatos paralisados devido à pandemia do coronavírus, a solução para as empresas que dedicam suas 24 horas ao esporte tem sido a reprise de jogos memoráveis. E a TV aberta também se jogou nesse saudosismo. O que é muito bom e válido.

Dezoito anos depois, milhões de brasileiros puderam assistir pela primeira vez ou rever pela enésima vez aquela final única entre Brasil e Alemanha, pela Copa do Mundo de 2002. A Seleção Brasileira venceu por 2 a 0 - dois gols de Ronaldo, que ainda não era Fenômeno.

Muito se discute a respeito das premiações e os status que alguns jogadores foram moldados desde então. Revendo o jogo, destaco com tranquilidade as seguintes verdades inconvenientes: Rivaldo foi o melhor jogador da Seleção Brasileira na Copa; Ronaldo é o maior centroavante da história do Brasil; e Kleberson foi o grande destaque daquela decisão.

Explico:

A posição de volante sempre foi pautada na questão de marcador, aquele que chega mais forte nos adversários, que seria responsável por dar o famoso chutão. E Kleberson passou muito longe dessas características.

O camisa 15, homem de confiança do Felipão, pode até ter sido coadjuvante em todo Mundial. Mas naquela decisão, ele estava inspirado. Hoje, na nova formação do futebol, temos o clássico volante box to box. Kleberson já havia sido isso há 18 anos.

Combatendo qualquer avanço pelo meio-campo, foi também o responsável por roubar a bola e iniciar a jogada do primeiro gol marcado por Ronaldo. Visão de jogo. Algo que Fernandinho, Ramires e Paulinho (na Copa de 2018, diga-se) não conseguiram se encaixar no modelo imposto por Tite.

Kleberson iniciou sua carreira no Atlético-PR, em 1999, onde se destacou rapidamente e conquistou o título do Brasileirão de 2001. Foi o melhor jogador daquele time que encantou o país àquela época. Todavia, não tem o reconhecimento devido naquele ano, pelo fato de Alex Mineiro ter feitos gols decisivos que levaram o Furacão à conquista inédita.

É uma injustiça dizer que Kleberson não merece destaque. Afinal, ele é um ídolo indiscutível no Furacão. E fez parte do último elenco que ganhou a Copa do Mundo. E merecia, por tudo o que jogou contra os alemães, fazer, ao menos, dois gols e deixar a sua história ainda mais brilhante.

sexta-feira, 10 de abril de 2020

Camila Lima, analista de desempenho da Seleção Feminina Equatoriana: "Me sinto na obrigação de evoluir constantemente"


Camila Lima é analista de desempenho da Seleção Feminina Equatoriana (Foto: Arquivo Pessoal)

Ainda é difícil encontrar mulheres que trabalham nas comissões técnicas das equipes de futebol. Mas é fato que a participação delas tem aumentado consideravelmente, seja como treinadora, dirigente e na análise de desempenho.

Exemplo disso é Camila Lima. Natural de São Paulo, mas residente em Pernambuco na maior parte de sua vida, ela é formada em Educação Física pela Universidade de Pernambuco, integrante do projeto Footure em Análise Tática, onde escreveu vários artigos sobre a Copa do Mundo Feminina, tendo como tema a Seleção Brasileira, eliminada para a França, e também dissertou sobre a Pia Sundhage, atual técnica do Brasil.

Aspirante a técnica de futebol, Camila trabalha com Emily Lima, ex-Santos e Seleção Brasileira, na Seleção Feminina do Equador. Em entrevista ao blog, revelou os primeiros passos na análise de desempenho, comentou sobre as transformações que passara e também falou sobre o clima no Equador, em meio à pandemia do coronavírus.

Como nasceu essa vontade de ser analista de desempenho?
Minha história começa como quase todas as histórias comuns no futebol: querendo ser jogadora. Eu sou paulista, mas vivi muito tempo em Pernambuco, isso não ajudou muito. Eu tentei, mas não deu. Entre estudar e jogar futebol, escolhi estudar, muito pela pressão da minha avó. Na faculdade de Educação Física, conheci o professor Fabiano Chokito, um dos melhores profissionais do Estado. Passei a tê-lo como referência, pois os conceitos táticos que ele passava eram muito bons. Um dos melhores treinadores de futsal. Com isso, virei treinadora da equipe feminina de futsal na universidade. Foi assim. Trabalhando bastante, aprendendo, errando. Estudei, além da parte tática,  a questão da neurociência, os pormenores do futebol. Quando saí da faculdade, passei a analisar as equipes pela televisão mesmo. Era papel e caneta. Anotava tudo e guardava as análises pra mim, raramente publicava no Twitter algumas coisas. Depois, acompanhei o Sport no Campeonato Brasileiro Feminino da Série A1. E tudo era com material simples: meu celular, papel, caneta. Não que o lado treinadora esteja presente, é algo que ainda mexe comigo, mas a análise de desempenho me encantou de vez. E os meus textos, minhas análises me levaram a pessoas incríveis, como a Emily Lima, a Rosana, e foi assim que eu cheguei ao Equador.

Quem são suas maiores referências nessa área de atuação?

Tenho muitas referencias que se misturam com analistas e treinadores: para citar dois analistas, cito Breno Lucena, que trabalha no time masculino do Náutico, e o Otávio Augusto, que trabalhou no Santa Cruz, e hoje é técnico do Sub-15 do Náutico. São profissionais capacitados, inteligentes. Para mim, o Eduardo Cecconi é um dos melhores do Brasil, tem uma visão muito diferenciada. Também gosto de trocar ideia com o Gabriel Eloi, do Vitória. A gente tem um grupo no WhatsApp, onde a gente conversa, troca ideias, ver o que eles discutem. A própria Michele Kanitz, que foi treinadora da Ferroviária, depois assumiu o cargo de analista de desempenho e trabalhou na equipe masculina do Corinthians, com o Osmar Loss. São muitas pessoas em quem me inspiro e, provavelmente, deixei de citar alguns nomes (risos).

Camila Lima ao lado da técnica Emily Lima, em um treino da Seleção Equatoriana (Foto: Arquivo Pessoal)
Qual o papel que o analista de desempenho exerce e qual a importância dos dados para os demais membros da comissão técnica?

O papel do analista de desempenho é auxiliar com análises, parâmetros dos treinos, o modelo de jogo, analisar as adversárias, para poder entregar o máximo de dados para a comissão técnica. Aqui falo como é o trabalho com a Emily Lima. Eu auxilio a treinadora a ter cada vez mais dados, sejam eles quantitativos, sejam qualitativos, tanto dos treinos quanto dos jogos. A gente analisa os scouts de cada atleta e contamos com a ajuda dos clubes onde elas jogam. Então, assistimos aos jogos e vamos analisando aquelas que possivelmente podem ser convocadas e que se adequem ao nosso estilo de jogo. Parte muita dessa coisa. Dentro da minha função, como a gente pegou uma seleção que vem se estruturando, partimos da premissa de montarmos um banco de dados para facilitar o nosso trabalho. Então, temos quantas atletas foram chamadas, avaliadas, em quais clubes elas jogam. O analista não é treinador. Sigo na premissa até onde posso ir. Se não for relevante pra ela (Emily), não é relevante pra mim. Coleto todos os dados possíveis e ajudo a diminuir a imprevisibilidade do jogo. Sabemos que o futebol é imprevisível, mas se consigo passar aquilo que enxergo, podemos ter uma pequena noção do que pode ocorrer.

Como é a relação entre você e as atletas?

Minha relação é extremamente profissional. A gente teve uma convocação atrás da outra nos últimos meses. Então, o que temos passado são os vídeos, alguns dados que sejam interessantes para as atletas. Tem sido boa esta troca de ideias. É tudo muito novo para elas. Sou a primeira analista de desempenho da Seleção Feminina. Logo, a gente tenta adequar as maneiras de trabalho. Notamos uma mudança de comportamento, porque elas começam a nos buscar para assistir aos vídeos, ver um lance de gol, os scouts das partidas. É uma cultura nova, tenho feito minhas avaliações para otimizar o meu método de passar as informações. Às vezes, as meninas podem não entender as palavras, mas sim as imagens. Vamos adaptando às culturas e vejo que elas estão se acostumando com as nomenclaturas. Por enquanto, tem dado certo.


Trabalho da analista de desempenho (Foto: Arquivo Pessoal)
Em sua opinião, por que há ainda um espanto ao deparar com mulheres no futebol?

Minha opinião passa pela estrutura social. A gente vive numa sociedade bem machista, sexista, que tem a mulher como objeto. Então, a gente vem de uma cultura que coloca a mulher numa posição de "fragilidade". O futebol reflete na sociedade. As mulheres foram proibidas de jogar futebol por muitos anos. Mulher de cabelo curto não jogava. Vejo com espanto. Passo por isso ainda. De vez em quando expresso minhas opiniões no Twitter e vejo as reações. Porém, tive ajuda de muitos caras que começaram a desconstruir esse processo e abriram a cabeça de outros homens. As coisas têm mudado aos poucos. a partir de uma desconstrução social. Um levantamento do GloboEsporte.com mostrava como eram as comissões técnicas das equipes femininas no Brasil, e o número mostrava que 30% dos integrantes das comissões são do sexo feminino (leia a matéria). Ou seja, a modalidade feminina que deveria ser dominada por mulheres, é dominada por homens. Mas acredito que estamos mudando essa imagem. As mulheres têm participado mais.

Como você recebeu o convite para fazer parte da comissão técnica da Seleção Feminina do Equador?
É uma história inusitada. O convite fez parte da construção desde 2019. A Rosana Augusto, que hoje é jogadora do Palmeiras, estava no Santos à época, e conhecia o meu trabalho pela internet. Com isso, a gente começou a trocar ideias e perguntei se seria possível uma troca de ideias com a Emily Lima, um estágio, qualquer coisa. Ela fez essa ponte. Fui para Santos, saí de Recife, e fui estagiária da Emily por 15 dias. Participei de todo o processo. Ela me deu muita abertura para entender o objetivo dos treinos, a questão dos jogos. O meu Dossie Vadão, que escrevi para o Footure, teve uma participação fundamental da Emily, porque analisei a parte tática da Andressa Alves, que estava no Barcelona, e fui conversando com a treinadora para entender a sua participação no esquema e modelo de jogo. Escrevemos juntos um capítulo no E-book sobre os números dela no Santos. Falei sobre a parte tática da Emily para ela mesma (risos). Acredito que isso foi fundamental para que Emily me escolhesse para estar ao lado dela.


E quando fui demitida do banco, em Recife, mandei mensagem para ela, dizendo que havia sido demitida e que estava à disposição para ajudá-la em qualquer coisa. Dias depois, me ligou, fazendo esta proposta de estar como analista de desempenho no Equador. É um desafio a cada dia. Todo dia eu sou grato a ela. Me sinto na obrigação de evoluir constantemente.

Qual foi a maior dificuldade nessa transferência de um país para outro?
A maior dificuldade, com certeza, foi a língua. Porque sempre estudei muito inglês, e tenho dificuldade com o espanhol, desde a escola. Vim para cá em novembro, então não tive muito tempo para assimilar as diferenças. Nunca tinha feito uma viagem para fora do Brasil. Mas fui começar a aprender o espanhol, os equatorianos da comissão me ajudam muito, aprendemos a conjugar os verbos. Quando não dava certo, partíamos para a mímica mesmo. E a outra dificuldade é a questão de estar longe dos meus familiares. Nunca tinha saído de casa, sempre fui muito apegada à minha família. Fiz parte de toda recuperação da minha avó, que tinha quebrado o fêmur. Isso aumentou ainda mais a nossa relação, porque eu ajudava na fisioterapia, ela havia perdido a confiança de andar em casa, de andar na rua. Estar longe deles é complicado. 

Estamos passando por uma crise sanitária e social muito forte, que é a pandemia do COVID-19. Como está a situação no Equador? Quais medidas foram adotadas pela Federação Equatoriana?
Equador é um país menor que o Brasil, em termos de território e população. Mas tem tido muitos casos de coronavírus. É um país que sofre com a desigualdade social, assim como o Brasil. É muito calor, a população não tem ficado isolada, e os casos aumentam drasticamente, a ponto de terem os corpos espalhados nas ruas, nos hospitais, de terem urubus em cima dos hospitais, por causa do mau-cheiro. O foco do coronavírus é Guayaquil. Estou em Quito e aqui tem toque de recolher a partir das 14h até às 5h do dia seguinte. Não vejo ninguém na rua. Tem multa em dinheiro para quem descumpre a regra, o governo tem tomado as medidas. A Federação tomou 20 medidas, e as principais são de não ter convocação agora, diminuir os custos da viagem, montar um plano para o calendário das competições. A casa da Seleção, onde eu moro, tem servido como leito do hospital. Vou completar um mês que estou aqui, desde o retorno da Argentina, onde disputamos o Sul-Americano Sub-20. Então, a Federação tem sido bem flexível nas decisões para arrumar as coisas pouco a pouco.

Em meio à pandemia, queria que você falasse, se possível, a respeito da transformação do seu trabalho e da sua rotina.

Meu trabalho é muito dependente dos clubes, então tem clubes, como o Independiente Del Valle, que tem postado vídeos das meninas treinando em suas casas. A LDU também tem feito isso. Assim, eu faço esse monitoramento pelas redes sociais. Toda sexta-feira a gente faz uma reunião com membros da comissão técnica para discutirmos sobre a preparação física, estratégias, processo de avaliação do Sub-20. Converso com as atletas para saber se elas estão mantendo a rotina, se estão em treinando. Porque se elas estiverem destreinadas quando voltarmos às atividades, o método de trabalho terá que ser diferente. Confesso que é difícil manter a minha cabeça focada. Não tenho visto TV, porque o excesso de notícias ruins pode me atrapalhar. Só saio para fazer as refeições. Então, a rotina passa por fazer essas coisas, seja monitorando, estudando, assistindo aos jogos que realizamos. Eu ainda faço um curso pela Internet, mas o serviço está carregado, aí enfrentamos dificuldades para acessá-la. Provavelmente, devemos ter novas medidas na próxima semana, por parte do Governo e da Federação, e isso resultará numa nova reunião para que possamos alinhar outros detalhes.

segunda-feira, 6 de abril de 2020

O futebol será diferente pós-quarentena

Futebol será diferente após a quarentena (Foto: Divulgação)
Estamos próximos de completar 30 dias sem uma partida de futebol sequer no Brasil. A abstinência está dolorida. Mas temos que entender que o atual momento é delicado. E que o principal adversário em campo é o coronavírus.

Mas como será o futebol após a quarentena que não tem prazo pra acabar?

Além da questão do calendário, já debatido aqui no blog, acredito que o ambiente será outro. Torço por isso, afinal.

A última partida da Copa Libertadores terminou em pancadaria envolvendo jogadores de Grêmio e Internacional, na Arena do Grêmio. O jogo terminou 0 a 0.

Aquelas imagens horríveis precisam ser apagadas da memória daquele torcedor(a) que esteve presente na partida. Ou daqueles que acompanharam no conforto de suas casas.

Existirá um mundo antes e depois do coronavírus. E isso é um fato.

Nossos hábitos hão de mudar, nossas relações, idem. E o modo de torcer? Os abraços serão mais demorados após sair um gol do seu time?

Como serão os jogos entre rivais? Será que "torcedores" ainda vão querer arrumar confusão nas proximidades dos estádios? Vale a pena perder amizades e partir para as barbáries por causa do futebol?

Estamos com saudades da bola rolando, do juiz apitando uma falta que claramente não foi, do VAR entrando em ação para confirmar ou invalidar o gol, das reportagens à beira do gramado, das entrevistas coletivas, nem sempre boas, dos jogadores e técnicos. Dos programas de debates. Da festa da torcida.

Chegará o momento em que olharemos o futebol com outros olhos.