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sábado, 30 de maio de 2020

Pandemia não é a única "culpada" pelo problema estrutural do futebol brasileiro

Foto: Getty Images
Mais de 70 dias se passaram, e o futebol brasileiro não retornou, ao contrário das principais ligas europeias que já estão com a bola rolando - o Campeonato Alemão voltou a ter jogo após 66 dias. Campeonato Português, Italiano e Espanhol também já têm datas definidas para o retorno - apenas o Francês não será concluído, uma medida acertada ou tomada cedo demais pelos órgãos competentes?

Com relação ao futebol tupiniquim, há uma pressa e pressão fortes para que a retomada dos jogos aconteça. Alguns clubes já estão treinando, mesmo não havendo nenhuma data precisa para que os Estaduais sejam concluídos e que o tão aguardado Campeonato Brasileiro seja iniciado.

Mas o que chama a atenção, em meio às reuniões sem fim e posicionamentos diferentes entre os times, é a questão financeira. Tão logo anunciada a paralisação dos torneios, os diretores foram aos microfones dizendo que a situação do time em questão estava difícil e que cortes e redução salarial seriam feitos - um processo de "readequação com base no momento atual".

Oras, não adianta colocar a "culpa" na pandemia do coronavírus. A doença nada tem a ver com as gestões irresponsáveis dos cartolas, que, sufocado pelas contas, querem esse retorno imediato. Vale lembrar que, nesse reinício de competições, não haverá torcida nos estádios - ou seja, uma fonte de renda a menos.

Se o Flamengo, time mais poderoso no Brasil neste momento, pede empréstimo e consegue uma linha de crédito de R$ 50 milhões para ter uma "sobra", mesmo que a situação esteja "equacionada", imagina a situação de outros clubes com menos poder aquisitivo?

Mais uma vez, os dirigentes terão que adotar a cautela, ou pelo menos tentar. Reorganizar a casa será mais do que necessário. Pés no chão na hora de fazer um investimento serão obrigatórios. 

Botafogo e Vasco quiseram trazer o jogador marfinense Yaya Touré. Uma lástima. No fim, o resultado previsível aconteceu: ele não veio nem para um, muito menos para o outro. 

Novamente teremos que ver aquela velha história de clubes pedindo o adiantamento das cotas da televisão, pedindo perdão pelas dívidas, etc.

Os dirigentes tentam pressionar o presidente da República para que ele tome uma decisão. Mas esbarra nos prefeitos e governadores que, com razão, querem evitar a realização das partidas de futebol. 

Vale salientar que o esporte não é uma atividade essencial. Futebol acima de tudo? Mesmo?

Hoje, o Brasil registra, até a publicação desta opinião, mais de 27 mil óbitos por Covid-19, estando na triste quinta colocação de países com mais registros da doença. São mais de 460 mil casos confirmados. 

Governo Federal, pressionado pela cúpula da Bancada da Bola, quer o futebol como lazer, enquanto mais de mil mortes acontecem por dia.

sábado, 23 de maio de 2020

O dia em que entrevistei Emerson Leão

Com a pandemia do coronavírus, e as atividades esportivas suspensas por aqui, tenho aproveitado o tempo para colocar a leitura em ordem e feito uma limpeza nos meus armários. E também quero fazer dessas horas livres para contar algumas histórias.

Hoje, conto de uma entrevista que fiz com o ex-goleiro e ex-técnico de futebol, Emerson Leão.

Em 2017, estava no meu último ano de faculdade. Época do Trabalho de Conclusão de Curso. Muitas horas de sonos foram perdidas (ou ganhas?) com aquele que é o projeto mais importante da vida de um aluno quando estava perto de se formar.

O tema do TCC era sobre o jornalismo esportivo em São José dos Campos, minha cidade-natal. Como a imprensa noticiou os principais fatos ocorridos? O futebol masculino teve seus anos de glórias, a natação sempre foi uma referência, o basquete tem uma tradição incrível, desde os anos 1980...

Não estava fazendo o projeto sozinho. Meu companheiro de barzinhos, conversas sobre esportes e outras resenhas era o Leonardo. Um grande amigo que a Faculdade de Jornalismo me apresentou. Sempre solícito e que me ajudara nas temidas regras da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). 

(Estudantes, se preparem: são muitas regras)

À la Bebeto e Romário, o entrosamento estava excelente. Íamos nos entendendo a cada dia, a cada entrevista. O nosso projeto estava próximo de ser finalizado. Mas senti que poderíamos acrescentar um "tempero a mais".

Nesta época, eu trabalhava em um portal de notícias esportivas de renome e conhecido pela sua qualidade. Eu tinha acesso a uma agenda de contatos e numa pesquisa, encontrei o nome e o telefone do Emerson Leão!!! Sim, o ex-goleiro teve uma passagem marcante no futebol da cidade. Era o "tempero" que eu precisava para dar aquele "tchan" no TCC.

E aqui deixo mais uma dica: salvem todos os contatos possíveis. Pode ser útil lá na frente.

Uma semana antes do feriado de 12 de outubro, liguei para Emerson Leão. Eu sabia da personalidade forte dele, portanto não poderia cometer um deslize sequer. O meu coração batia acelerado, estava tenso. Como seria a reação dele ao telefone?

Tuuuu, Tuuuu, Tuuu... 

"Alô, quem fala?". Era ele no outro lado da linha. "Bom dia, senhor Emerson Leão?", respondi. "Sim, quem gostaria?"

Foi assim o início da conversa. Apresentei-me como estudante de Jornalismo e expliquei o motivo do meu contato. Questionei se ele poderia me conceder uma entrevista para falar sobre a sua experiência em São José dos Campos, que era para o meu último projeto da faculdade. 

Claro que se ele recusasse, eu ficaria frustrado, mas entenderia, afinal, por quê Emerson Leão gastaria o seu precioso tempo para falar com um estudante?

Leão não foi como um leão, agressivo. Muito pelo contrário. Ele pediu para que eu retornasse a ligação na semana seguinte ao do feriado. "Claro, posso sim, sem nenhuma problema", respondi. Ao final, ele agradeceu e mandou um forte abraço.

Minha reação ao colocar o telefone no gancho foi de perplexidade, surpresa e emoção. Eu consegui falar com um atleta de Seleção Brasileira!!

Passada uma semana, liguei para Emerson Leão, como havíamos combinado. Prontamente, atendeu. Parecia estar esperando a minha ligação, penso.

Novamente, expliquei o motivo do contato, falei sobre o meu projeto e ele gostou da abordagem: "Que legal! Bem, minha passagem pelo São José...". Inacreditável.

Emerson contou bastidores, histórias, momentos e fez uma comparação com a atual fase do São José Esporte Clube, principal time da cidade e que hoje disputa a quarta divisão do Campeonato Paulista.

Leão ficara triste com a queda abrupta da equipe. Foram 15 minutos de uma conversa enriquecedora. O ex-jogador e ex-técnico de futebol respondeu a todos os questionamentos. Ao final da entrevista, muito seguro, começou a puxar assunto comigo sobre o meu trabalho, como estava o andamento do projeto e desejou boa sorte na empreitada.

O coração do então estudante de Jornalismo estava mais acelerado ainda! Minhas mãos tremiam! Tinha um belo material a ser decupado. Agradeci de peito aberto pela atenção, principalmente, e pelo respeito com o meu trabalho. Ele também agradeceu pela forma como conduzi a entrevista, e novamente me desejou boa sorte.

Não aguentei. Quando desliguei o telefone, as lágrimas vieram. Arrisquei uma entrevista com uma pessoa midiática, influente e deu muito certo. Digo que foi um golaço marcado.

De todas as entrevistas que fiz, com certeza, esta foi a mais simbólica, porque fez parte de um dos projetos mais importantes da minha vida, até aqui.

Não sei se Leão irá ler este texto um dia. Mas faço questão de agradecê-lo, uma vez mais!

quinta-feira, 21 de maio de 2020

Dirigentes negacionistas só pensam no futebol: acordem, senhores

Gabriel Barbosa - o Gabigol - realiza exame médico no Ninho do Urubu (Foto: Alexandre Vidall/Flamengo)
Parece piada, mas não é. Infelizmente. No mesmo dia em que o Brasil registrava 1.179 mortes por coronavírus – recorde negativo, desde o anúncio do primeiro óbito pela Covid-19, em 17 de março – presidentes de Flamengo e Vasco, Rodolfo Landim e Alexandre Capello, respectivamente, foram para Brasília (quem pagou?) se reunir com o Presidente da República para discutir – pasmem – o retorno do futebol. Não é possível!

Um adendo que cabe aqui fazer nesta "reunião da vergonha": o médico Márcio Tannure trabalhou todo paramentado, na hora de realizar os exames nos jogadores rubro-negros. Em compensação, em Brasília, não seguiu nenhuma orientação médica. Rasgou o diploma de um dia para o outro, assim como Campello, dirigente vascaíno. Como pode? 

Em um mundo devastado pela doença, dirigentes negacionistas querem a todo custo retomar as atividades. Querem treinar. Querem jogar. Até o momento, não vi a mesma força e vontade desses dirigentes em discutir novos formatos das competições, um novo calendário, medidas para ajudar os clubes de menor estrutura e recurso financeiro.

Melhorem, senhores! Sejam mais humanos!

Enquanto Flamengo e Vasco mancham suas páginas, o membro do Comitê Gestor de Futebol do Botafogo,  Carlos Augusto Montenegro, tem dado uma aula de como se comportar em meio à pandemia. Declarações fortes, porém necessárias. “Pode vir o Papa, presidente, ministros, o Botafogo não vai treinar”, reforçou Montenegro, em entrevista ao Troca de Passes, programa do SporTV.

Vale citar, ainda, que o Flamengo, que não tem aval da Prefeitura do Rio de Janeiro, para realizar suas atividades, segue com a sua rotina de treinos normalmente. Como se nada tivesse acontecendo ao seu redor. Aliás, o clube teve jogadores detectados com a doença. O massagista Jorginho, um dos personagens mais icônicos do clube, faleceu, vítima do coronavírus. E daí? Temos que treinar. Para enfrentar quem?

Fernando Prass, goleiro do Ceará, foi enfático ao dizer que o futebol não é uma atividade essencial. E está mais do que certo. Infelizmente, poucas lideranças têm feito aparições para corroborar com aquilo que foi dito mais de uma vez por pessoas inteligentes, como o Prass.

O Brasil é enorme. Cada Estado tem enfrentado sua dificuldade e visto a sua realidade de perto. Será que ainda teremos que debater sobre a retomada do futebol no país, em meios a tantos óbitos e casos confirmados? Que absurdo! 

Dirigentes que querem a volta da modalidade, alegando crise financeira e momento difícil, usam da pandemia para culpa-la. Mas, na verdade, já sabiam do déficit cabuloso há muito tempo. 

Portanto, parem de fazer política e abaixar a cabeça para tudo o que um irresponsável no poder diz. O futebol é a coisa menos importante, no momento. 

quarta-feira, 13 de maio de 2020

Campeonato Alemão é a grande atração do final de semana

Sem abraços na comemoração do gol (Foto: EFE)
Depois de 66 dias de paralisação devido à pandemia do coronavírus, o Campeonato Alemão - a Bundesliga - estará de volta. O primeiro jogo será Borussia Dortmund x Schalke 04, às 09h30 deste sábado, 16. Com certeza será a partida mais assistida, por motivos óbvios.

Mas uma série de protocolos precisará ser seguida:

  • Serão permitidos apenas 98 funcionários na área do campo. Logicamente, não haverá torcida;

  • Até mesmo os mascotes das equipes não serão permitidos;

  • Os times estão em isolamento completo, seja em hotéis ou nos centros de treinamentos
E na hora do gol? Nada de abraços. As comemorações precisarão ser bem mais tímidas. Até mesmo a tradicional foto com os jogadores perfilados, o cumprimento entre atletas e arbitragem e a troca de camisas também estão vetadas.

No banco de reservas, todos os jogadores e membros da comissão técnica terão que usar máscara, além de manter um bom distanciamento.

Acabado o jogo, nada de banho nos vestiários. Os jogadores vão embora para suas casas e lavarão seus próprios uniformes.

A ansiedade e a curiosidade aumentam a cada dia para saber se todos essas medidas serão cumpridas. Pensando no comportamento europeu, acredito que não haverá violação por parte dos atletas. O problema é o seguinte: alguém fugirá do isolamento e poderá provocar aglomerações em volta dos estádios?

Enquanto isso, aqui no Brasil, os negacionistas querem a volta do esporte, e o país registra mais de 800 mortes e acumula a marca negativa de sexto com mais número de casos, ultrapassando a própria Alemanha.

Qualquer pessoa com um mínimo de inteligência, consciência e sensibilidade sabe que não há a menor capacidade de retornar o futebol no Brasil. Inclusive, os treinamentos presenciais - o que é um absurdo. Grêmio e Internacional conseguiram manchar suas páginas gloriosas.

Os jogadores precisam entender que eles são vistos como referência para muitas pessoas. Ou seja, se eles saem para jogar uma "peladinha" em Belo Horizonte ou praticar um futevôlei na praia do Rio de Janeiro, eles estão influenciando os demais a tomarem a mesma atitude. Todavia, a recomendação mais dita pelos profissionais da medicina, da ciência é simples: fique em casa.

O negacionismo tem sido o mal do século para os dirigentes que apenas pensam na ganância, no lucro. Enquanto isso, faltam respeito, solidariedade e empatia.

sábado, 2 de maio de 2020

Carta ao Dr Sócrates

Fala, Dr Sócrates, tudo bem?

Infelizmente, não te conheci. Queria ter conversado contigo, ter te entrevistado, mas não deu.

Quando você morreu, em 2011, eu estava me preparando para ver Corinthians x Palmeiras, pelo Campeonato Brasileiro. Jogo que, inclusive, sacramentou o título do Timão.

Aliás, fiquei emocionado em ver os jogadores com o punho cerrado, uma homenagem muito justa, por sinal.

Sabe, Sócrates. Por aqui, tá foda. Tá tudo muito cinza.

Dão palanque pra otário dançar.

Dão palanque pras asneiras.

Não querem que futebol e política se misturem.

Aí comecei a reler novamente o livro escrito por Tom Cardoso, que descreveu brilhantemente sua trajetória. Como atleta e como cidadão.

Porra, Sócrates. Querem que o seu legado seja jogado no lixo.

Desdenharam da Democracia Corinthiana. Assim não se faz.

Seu irmão, Raí, herdou o seu lado politizado, de um cara culto, inteligente e manifestou uma opinião forte e bem importante, fugindo dos padrões daquelas entrevistas monótonas e chatas pra cacete.

Mas alguns, que nem foram craques e só ocupam um lugar na crônica esportiva deus sabe como, achou ruim. Rebateu os comentários.

Diz que futebol e política precisam ser separados. Como faz, doutor??

Não é possível, Sócrates. Está duro de ver.

As coisas estão difíceis por aqui.

Infelizmente, o país ficou mais pobre e menos inteligente com a sua partida, Sócrates. Tá osso.

A balbúrdia, o apoio à tortura e o "e daí" para se referir aos mais de 5 mil mortos pelo coronavírus são tratados como "coisas normais" e tem gente que até dá risada.

É, querido Sócrates, alguns habitantes deste país não quiseram te ouvir. Pena deles.

Sorte dos bons que te acompanharam e democratizaram o Brasil através do Corinthians.

Muito obrigado, Sócrates, pelos ensinamentos diários.

Abraços